Crônica ao Pai

 Posted by at 12:59 pm  Crônicas, T.I.
ago 082010
 

O capitalismo domesticou a civilização ocidental a demonstrar afeto temporal. Existem épocas para a demonstração de carinho explícito para figuras chaves de nossas culturas. Onde, invariavelmente, as agraciadas com bens materiais de alto valor monetário são objetos de admiração ou inveja. E quem as presenteia, alvo de cobiça ou respeito.

Tais figuras como Mãe, Pai, Namorados, Natal, Páscoa e as de primeira grandeza são alvos de super exposição nos grandes meios de comunicação. Vendem, empregam, movimentam a economia, criam uma aura de prosperidade, mesmo que vazia, e entorpecem qualquer discussão mais densa sobre seus efeitos na humanidade. Mas já reparou que não se comemora efusivamente o dia dos Avós? E os dos tios? E tem cada tio fora de série por aí…

A velha crença de que só a mãe é insubstituível provavelmente nasceu em algum ranking de dias de maior vendagem. É fato que ela provê e transporta toda responsabilidade de uma vida em seu corpo e sua alma. Mas se a mãe é insubstituível ao nascer, pois que o pai é insubstituível na estrada. Indiferente se de terra batida ou pista dupla, a base está ali. Por todo lado.

Constatar que não nos regemos por estas “crenças mercantis” é fácil. Veja quantas mãe-pais e pais—mães na sociedade. O engessamento está na idéia de que somente nestes dias devemos nos relacionarmos com maior contato com eles. A evolução está na demonstração diária, para qualquer um, independente de pronomes de tratamento.

A mãe cria as asas. O pai dá o pé na bunda.

abr 112010
 

Em uma rodinha de amigos em um boteco de esquina lá pelas bandas do Campos Elíseos:

– Rapaz, você viu? Caiu um avião lá na Polônia e matou o presidente, vários deputados e maior pessoal do alto escalão. Já pensou se isso acontece no Brasil?

– O problema é que aqui no Brasil teria que cair a frota inteira de aviões com políticos dentro pra ver se muda algo…

Praga involuntária

 Posted by at 4:52 pm  Crônicas, T.I.
mar 232010
 

Era uma vez um rato. Ele era cinzento e feio, o bico escuro, as penas esgarçadas. Sim, era um rato de asas, mais conhecido como pombo. Vivia em qualquer canto entre a Catedral de Ribeirão Preto e a praça XV, fazia das árvores, marquises e sacadas a sua casa. Comia o que aparecia: sementes, insetos, pipocas espalhadas no chão do calçadão. Muitos achavam que era até bonitinho, apesar de ser realmente feio, e geralmente lhe arranjavam comida. Outros o detestavam, principalmente aqueles que eram alvo de suas rajadas fétidas. Parecia até de propósito, mas não era, acontece que ele as expelia com muita frequência. Culpa de uma alimentação pouco balanceada.

Pobre pombo. Condenado a viver entre os prédios de concreto, na imundície da cidade grande. Natureza, para ele, eram as poucas árvores das duas praças, as quais ele tinha que dividir com seus colegas de espécie. Superlotação em cada galho, apavorando os transeuntes abaixo. Além de tudo, ainda tinha que suportar o apelido: rato de asas. Sujo, horroroso e transmissor de doenças. Pois a sujeira do dia-a-dia era um ambiente perfeito para diversos parasitas e microrganismos em geral, que infectavam seus amigos pombos e todos que conviviam com eles. Mais um motivo para ser odiado.

Vida curta, existência breve. Ninguém se importava particularmente com ele, tampouco com sua espécie em geral. Mal-visto e indesejado em todo lugar. Havia até mesmo um padre que soltava rojões para espantar todos os pombos, pois a praça da Catedral estava se tornando um local impraticável por causa da sujeira que os acompanhava. Não que tivesse algum outro lugar para ir, nem estava ali por vontade própria. Apenas fugia instintivamente quando ouvia o estouro, para retornar tempos depois atrás de comida e abrigo. Não tinha culpa de ser uma praga urbana.

mar 232010
 

Quando você acredita que o mundo acabou, que nada mais tem volta, que a esperança se tornou uma lenda das histórias em quadrinhos, eis que sempre aparecem seres para nos dar aquele chacoalhão e falar: “ei, se liga aí que ainda tem coisa pra fazer!”

Emoção. É o sentimento que esse reles mortal, autor destas singelas linhas, sentiu ontem (22/03) ao ver o programa CQC da Band, na matéria sobre o aparelho de TV doado ao sistema educacional municipal de Barueri.

Emocionei-me como há muito não me emocionava. Foi uma matéria com que, em outros tempos, eu me empolgaria e daria risadas com as brincadeiras feitas por Danilo Gentili e Rafinha Bastos no quadro “Proteste Já”. Ficaria empolgado por ver uma OBRA jornalística de tamanha qualidade sendo veiculada para milhões de pessoas, mesmo porque nem a velhinha de Taubaté acredita mais naquelas contagens de audiência que apontam 50% dos televisores ligados na Rede Globo vendo comédia romântica de quinta categoria e nem 5% dos televisores ligados vendo o CQC simplesmente arrasar. É subestimar a inteligência de qualquer um, isso.

Porém, o sentimento ontem não foi (só) euforia, foi emoção. Daquelas que vem dos confins mais profundos do inconsciente, que reordena sua visão de mundo, que te arranca lágrimas dos olhos.

No meio de tanta ridicularidade no jornalismo, profissionais desiludidos com o futuro, rendidos ao departamento comercial, chegam lá sete “babacas” despretensiosos e mostram para esses mesmos profissionais “honoráveis”: “Olha aqui, ISSO é jornalismo! Dá pra fazer! Vejam e aprendam! É só vocês levantarem das suas confortáveis cadeiras e pararem de apreciar a caixa de email lotada de releases”.

Esses “babacas” são o nosso futuro. A Geração Y está aí. Ontem o CQC deu o recado final, algo como  um  ultimato darwinista de uma linha inscrito “adaptem-se ou serão eliminados”. A era dos porcos está por um fio. A foice degoladora dos lamacentos terá a palavra “ética” esculpida na lâmina. A coisa se inverteu: Nós não precisamos mais de vocês, são vocês agora que precisam de nós.

Adorei o rótulo “babaca” que foi dado a quem faz jornalismo DE VERDADE.  Sinto-me bem representado quando tais palavras saem da boca de quem saiu. É uma homenagem! Espero que o pessoal do CQC esteja lisonjeado também e se sintam cada vez mais na obrigação de serem mais “babacas” ainda.

E como diz meu “amigo-irmão”  Marcelo Dias: “Ah que saudade do futuro…”