Ontem nós brasileiros demos mais uma demonstração de que o conceito de “público” por aqui significa “número de espectadores na arquibancada”. Na matéria Empreendimentos em cartões postais geram polêmica do Fantástico, nosso povo varonil mostrou que pouco se importa com a depredação de cartões postais ou áreas públicas, principalmente se essa depredação for um empreendimento para o público de alta renda.
Alguma coisa deu muito errado, como disse Gabriel Monge em sua resposta à internauta brasiliense no artigo Nobre (pobre) Natureza Humana. No caso da ignorância da diferenciação entre “público” e “privado”, é algo que acontece no Brasil como em poucos lugares do mundo. Talvez seja essa “herança maldita” que carregamos dos que começaram a colonizar o país: a escória (queiramos ou não, a escória da Europa veio para cá durante os primeiros séculos da colonização).
Como disse Vicente Golfeto em um Jornal da Clube no mês de fevereiro, quando temos uma propriedade material e estamos no nosso perfeito juízo mental, a tratamos com muito cuidado e a conservamos o máximo possível. Isso não acontece com o que é público pois a maioria das pessoas não se considera “dona” do que ali está. Muitos tratam propriedade pública como sendo do “Estado” ou de “alguém”; Não temos a mentalidade cidadã para saber que um banco de praça é tão meu quanto seu e do Golfeto. Esse é um dos motivos pelos quais depredamos tudo que está na rua e jogamos o lixo no chão e nos bueiros (para depois reclamarmos as consequencias com as autoridades).
O preceito de cidadania não é muito difícil ensinar. Meu sobrinho de cinco anos já sabe que não é muito interessante jogar lixo no chão da rua. Sem precisar de bronca da mãe ele cumpre a tarefa de jogar o lixo no lixo.
Seria perda de tempo pedir para o governo ensinar cidadania básica para as pessoas. Por mais que já existam iniciativas do gênero, ninguém vai “engolir” os ensinamentos de uma entidade onde a maioria dos seus contribuintes não sabem seus direitos e deveres. Ensinamentos básicos de cidadania tem mesmo de vir daqueles que chamamos de “meu” (pai, mãe, avó, tios…) para então entendermos o que é nosso e o que não é.
Só há um problema que mata o parágrafo anterior: muitos desses “meus” também não receberam dos “seus” esse ensinamento básico.
Quando a massa se sente insatisfeita, ou simplesmente tem algum forte desejo, é para ela uma grande tentação essa possibilidade permanente e segura de conseguir tudo – sem esforço, luta, dúvida ou risco -, sem precisar fazer nada além de apertar a mola e ligar a portentosa máquina [estatal].
José Ortega y Gasset – A Rebelião das Massas